Trump ameaça o Vale do Silício

Acostumadas a correr em busca das melhores inovações, as empresas de tecnologia do Vale do Silício entraram, na última semana, em uma nova disputa: tentar reverter, ou, ao menos minimizar, os efeitos das mudanças nas políticas de imigração dos EUA propostas pelo presidente Donald Trump.
As novas regras, que dificultam a entrada e a permanência de estrangeiros no país, são um forte golpe para as companhias que, nos últimos anos, investiram muito na contratação de mão de obra estrangeira para ajudar no desenvolvimento de seus produtos e serviços. “Por sua atuação global, as empresas de tecnologia procuram uma mão de obra muito especializada, e por isso buscam os melhores talentos ao redor do mundo. Os EUA não têm como atender [sozinhos] a essa demanda”, diz Rachel Massaro, vice-presidente da Joint Venture, consultoria especializada em assuntos daquela região. ”
Dados compilados pela Joint Venture indicam que 37,4% dos residentes no Vale do Silício são imigrantes, muito acima do que foi verificado no Estado da Califórnia (27,1%) e quase três vezes maior que a média dos EUA (13,3%). Entre os empregados com idade de 25 a 44 anos, a taxa chega a 50%, como mostrou artigo, assinado por Gustavo Brigatto, no Valor de 06/02.
Nas áreas de computação e matemática, três entre cada quatro trabalhadores nessa mesma faixa etária é oriunda de outros países. A Joint Venture não faz quebra por nacionalidades, mas ela é bastante variada, incluindo chineses, indianos, filipinos, japoneses, mexicanos, brasileiros etc. Por conta desse perfil, o impacto das medidas no Vale do Silício é desproporcional, segundo Rachel, o que justifica a movimentação das empresas de tecnologia nos últimos dias.
Não é só como funcionários que os estrangeiros contribuem com a inovação. Eles também criam suas próprias empresas. A estimativa é que 50% das startups com valor de mercado superior a US$ 1 bilhão dos EUA – os unicórnios – tenham sido fundadas por estrangeiros. Na lista de fundadores há nomes como Sergey Brin, do Google, que emigrou com a família da Rússia, e os brasileiros Eduardo Saverin, cofundador do Facebook , e Mike Krieger, do Instagram.
Nos últimos dias, memorandos, declarações em publicações em redes sociais, avaliações de medidas judiciais e até atos mais simbólicos – como o da equipe do Periscope, que colocou a mensagem “Feito com orgulho, por imigrantes, nos EUA” na tela de abertura de seu aplicativo – circularam pela rede expressando o mesmo tom de preocupação das empresas.
“Meus bisavós vieram da Alemanha, da Áustria e da Polônia. Os pais de Priscila são refugiados da China e do Vietnã. Os Estados Unidos são uma nação de imigrantes, e têm de se orgulhar disso. Como muitos de vocês, estou preocupado com o impacto das recentes ordens executivas assinadas pelo presidente Trump”, escreveu o fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, em sua página na rede social, citando as origens de sua esposa.
Internautas também manifestaram sua insatisfação. Uma campanha incentivando que as pessoas apagassem o aplicativo Uber de seus celulares (a #DeleteUber) varreu a internet. Com isso, cresceu repentinamente o número de instalações do serviço de seu principal concorrente nos EUA, o Lyft, e Travis Kalanick, cofundador do Uber, saiu do conselho de assessoramento econômico criado por Trump.
E a briga está longe de terminar. A seu favor, as empresas de tecnologia têm seus caixas recheados e um histórico de defesa de seus interesses no mundo político. Segundo levantamento do Center for Responsive Politics, em 2016, o total investido em lobby ficou próximo a US$ 60 milhões, o maior valor desde 1998. A Alphabet, controladora do Google, foi quem mais gastou: US$ 15,4 milhões. Na sequência ficaram a Amazon, com US$ 11,3 milhões e o Facebook com US$ 8,7 milhões.

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