Tillerson e aliados asiáticos atenuam ameaça de Trump

Os dois países mais ameaçados por um eventual ataque da Coreia do Norte rejeitaram a ameaça do presidente dos EUA, Donald Trump, de responder com “fogo e fúria”. O secretário de Estado americano também minimizou o risco representado pela Coreia do Norte. O temor de uma crise maior na Ásia fez as bolsas caíram ontem.
A agência de notícias Yonhap citou uma autoridade não identificada do gabinete presidencial da Coreia do Sul que afirmou que não há uma “crise iminente”. Uma autoridade japonesa do alto escalão, que pediu para não ser identificada por estar discutindo deliberações internas, disse que não há uma mobilização para um ataque militar e que pouquíssimas pessoas no governo estão levando a sério os comentários de Trump, como mostrou artigo do Valor Econômico publicado em 10/08.
A fraca reação reflete em parte a longa história em torno das ameaças da Coreia do Norte. Os dois aliados dos EUA há muito se encontram na linha de fogo de Kim Jong-un e acabaram se acostumando às ameaças de morte e destruição do regime comunista.
A Coreia do Norte elevou mais a sua retórica agressiva nos últimos dias em resposta às recentes sanções impostas pela ONU, inclusive com aprovação da China, o único aliado do regime norte-coreano. As sanções devem restringir mais as exportações de país e ampliar o seu isolamento econômico.
Segundo a mídia americana, Trump vinha discutindo com assessores uma escalada verbal contra a Coreia do Norte, com o objetivo de pressionar o país a negociar o fim de seu programa de armas nucleares. Mas a declaração de “fogo e fúria” não foi previamente escrita e pegou a equipe de Trump de surpresa.
O secretário de Estado, Rex Tillerson, buscou tranquilizar os EUA e seus aliados, dizendo que “os americanos podem dormir tranquilos à noite” e que “não há ameaça iminente de guerra”.
Para iniciar uma guerra contra a Coreia do Norte, Trump precisaria de autorização do Congresso americano, o que não é certo que ele consiga. O presidente só poderia usar a força sem essa autorização no caso de os EUA serem atacados.
Mas, ainda ontem, o secretário de Defesa, James Mattis, alertou a Coreia do Norte de que o país corre o risco “do fim de seu regime e da destruição do seu povo” se atacar os EUA ou qualquer um dos aliados americanos na região. Mattis disse que as forças conjuntas dos EUA e de seus aliados “possuem as capacidades defensivas e ofensivas mais precisas, testadas e robustas” do planeta, numa continuação da escalada verbal de Trump.
O presidente Trump voltou ao tema ontem, indiretamente, ao dizer que, sob seu governo, o arsenal nuclear dos EUA “é maior e mais poderoso do que nunca.”
As ameaças de Trump expuseram uma crescente preocupação com a confiabilidade dos EUA enquanto parceiro estratégico. Trump já havia dito que a Coreia do Sul e o Japão deveriam pagar mais para hospedar tropas americanas e negociar acordos comerciais em troca disso.
“A prioridade dada à pátria e à segurança interna [dos EUA] vem abalando muitas verdades tradicionais, como a ideia de que os EUA defenderiam Seul como se fosse Los Angeles”, disse John Park, diretor do Korea Working Group da Harvard Kennedy School. “Agora, a visão é que, para proteger o solo americano, danos colaterais lá [Seul] são aceitáveis.”
Em julho, o general Joseph Dunford, o chefe do Estado-Maior Conjunto dos EUA, disse ser “inimaginável” permitir à Coreia do Norte ter a capacidade de atingir uma cidade americana com uma arma nuclear. O senador Lindsey Graham disse à NBC News na semana passada que Trump afirmou a ele que “se milhares morrerem, eles vão morrer por lá [na Coreia]”.
Analistas observaram ainda que a retórica inflamada e inesperada de Trump passou a alimentar a sensação de que são os EUA que estão introduzindo imprevisibilidade em uma dinâmica já bastante volátil. Além disso, há ainda a questão da erosão da credibilidade dos EUA, caso o presidente não cumpra as ameaças prometidas.
A possibilidade de um conflito na região agitou investidores ontem. A reação começou justamente na Ásia. O índice referencial de ações da Coreia do Sul, o Kospi, caiu 1,1% para o menor patamar desde 21 de junho, enquanto a moeda local, o won, teve a maior queda em três semanas. O índice Topix da Bolsa de Tóquio teve a maior queda em quase três meses.
O presidente sul-coreano, Moon Jae-in, desistiu das tentativas iniciais de aproximação com Kim, especialmente depois que a Coreia do Norte testou dois mísseis balísticos intercontinentais em poucas semanas. Ele pediu diálogo com os EUA para considerar a colocação de mais baterias de defesa antimíssil na Coreia do Sul, medida que ele antes havia descartado.
As repetidas provocações da Coreia do Norte vêm alimentando pedidos na Coreia do Sul para que o país tenha armas nucleares. Os críticos afirmam que isso desencadearia uma corrida armamentista, levando inclusive o Japão a buscar uma forma de dissuasão nuclear, o que aumentaria ainda mais as tensões na região.

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