‘Startups’ buscam novas formas de captação


Mark Hedlund e outros fundadores estão lançando uma empresa chamada Skyliner, semelhante a uma “startup” normal, mas com uma exceção importante.

Os fundadores são todos engenheiros e, coletivamente, veteranos de grandes empresas de tecnologia como Microsoft Corp., Yammer Inc., Etsy Inc. e Stripe Inc. A sede fica na área da Baía de San Francisco. E, como ocorre com muitas startups, os fundadores mantêm segredo sobre seus planos, como mostrou material do The Wall Street Journal, assinada por Christopher Mims, publicada no Valor de 2/06.

Mas a Skyliner difere em um aspecto: ela conseguiu evitar, até agora, algo que parece um pré-requisito para a inovação e o crescimento: o capital de risco.

O capital inicial de US$ 800 mil da Skyliner vem de outro tipo de fonte: a Indie.vc, comandada pelo investidor de risco Bryce Roberts.

Na segunda-feira, a Indie.vc, que conta com recursos de Pierre Omidyar, fundador do eBay Inc., e de Fred Wilson, da firma de capital de risco Union Square Ventures, anunciou seu segundo fundo de US$ 30 milhões.

Apesar do envolvimento de investidores de risco tradicionais, a startup opera de outra maneira, diz Roberts.

Uma das diferenças é que a Indie.vc não compra uma fatia das empresas que financia, embora mantenha a opção de converter seu investimento em participação acionária se a firma for vendida ou abrir o capital.

Em outros casos, ela recupera seu investimento retendo uma parte dos salários dos fundadores depois de certo ponto. Uma empresa que queira ficar para sempre com capital fechado paga à Indie.vc, em dinheiro, até cinco vezes a quantia investida.

Este arranjo, e a filosofia que o sustenta, nasceu da frustração com o capital de risco tradicional que, segundo Roberts e outros, leva os fundadores a tentar criar a próxima firma de US$ 1 bilhão, as chamadas “unicórnios”, ou então morrer tentando.

“Acho que as pessoas criam um fetiche sobre a captação de recursos”, diz James Nord, um dos fundadores da Fohr Card, firma que ajuda grandes marcas a usar publicidade nativa (que oferece conteúdo) em sites. A Fohr Card participou do primeiro fundo da Indie.vc em 2015. “Na comunidade das startups, a captação de fundos é vista como uma validação da ideia [do fundador]; é vista como sucesso.”

Nord diz que o capital de risco tradicional muitas vezes se torna um “financiamento em gotas”, que incentiva os fundadores a fazer grandes gastos antes de começarem a lucrar, num grande esforço para crescer, o que acaba exigindo mais recursos.

“Depois de três anos, os fundadores examinam sua firma e veem que têm 45 pessoas, mas não têm um modelo de negócios real, possuem apenas 4,5% da empresa e estão se perguntando o que aconteceu”, diz ele.

Para ser justo, muitas empresas importantes, inovadoras e gigantescas foram e continuarão a ser construídas com capital de risco. No ano passado, os investimentos nos Estados Unidos totalizaram US$ 72,3 bilhões. Isso vale especialmente para firmas que precisam de grandes volumes de capital para aumentar rapidamente a escala ou entrar em um novo mercado, tal como a Uber Technologies Inc. ou a Box Inc. A própria Indie.vc é um projeto paralelo para Roberts, que a considera um “um teste”.

Para as empresas que recebem capital de risco, ele exerce um impacto muito forte. Um relatório recente da Fundação Kauffman, dos EUA, constatou que menos de 5% de todo o financiamento de startups vem de investidores de risco e apenas 6,5% das startups de alto crescimento tomam esse tipo de recurso. No entanto, 37% das firmas que abriram o capital entre 1980 e 2005 tiveram financiamento de capital de risco.

Mas Roberts argumenta que o modelo de risco tradicional não funciona para a maioria das empresas. Alguns fundadores concordam. A Atlassian Corp., fabricante de software colaborativo que abriu o capital em dezembro de 2015 e está avaliada em cerca de US$ 5 bilhões, cresceu sem financiamento de capital de risco, usando sua receita para se financiar.

“O capital de risco pode ser como uma hipoteca que você não consegue pagar”, diz um dos fundadores da Atlassian, Scott Farquhar. “Parece ótimo na hora, mas você se arrepende quando as parcelas da hipoteca se tornam massacrantes e você percebe que nem precisava de uma casa tão grande.”

A Fohr Card, fundada em 2012, começou com capital inicial de US$ 250 mil da Indie.vc. e financiou seus primeiros três anos, em boa parte, com as próprias receitas. Depois recebeu US$ 750 mil da OATV, um fundo de capital de risco tradicional do qual Roberts é diretor administrativo.

Essa trajetória sugere uma terceira via para as startups, que ficaria entre o hipercrescimento e o chamado “bootstraping”, ou financiamento com as próprias receitas. Nord diz esperar que o investimento da OATV seja “a última quantia que a Fohr Card vai precisar tomar emprestado”.

Roberts acredita que o capital de risco tradicional pode ter atingido um “limite natural” e quer explorar outros tipos de financiamento. O capital de risco é “um modelo de 50 anos de idade que não mudou; não se adaptou”.

Ao oferecer às empresas uma alternativa ao capital de risco tradicional e também ao autofinanciamento, a Indie.vc quer permitir que elas cresçam seguindo o seu próprio ritmo.

Isso não elimina a possibilidade de um ótimo resultado financeiro para todos, diz Roberts. Significa apenas que não é necessário que a empresa tenha um sucesso monstruoso para que o fundo e os fundadores prosperem. Basta simplesmente que ela tenha sucesso.

Podemos afirmar que há outros fundadores procurando a mesma coisa. Vários fundadores de empresas financiadas pela Indie.vc com quem conversei querem dominar o mundo, como é típico no Vale do Silício. Mas não estavam certos de que conseguiriam isso antes de o fundo de capital de risco ter de devolver o dinheiro a seus investidores, em geral após 10 anos.

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