Londres vê caos em um Brexit sem acordo

O governo britânico descreveu potenciais episódios de escassez de combustível e medicamentos, longos congestionamentos em portos e alta dos preços dos alimentos num relatório em que delineia o “pior dos cenários possíveis” para o caso de o Reino Unido sair da União Europeia (UE) sem um acordo que organize a saída.
O relatório, que o governo foi obrigado a divulgar ontem sob pressão do Parlamento, pinta um quadro sombrio de risco de escassez de combustíveis em Londres e de medicamentos, presos nas filas nos portos na França, devido à implementação de vistorias alfandegárias entre os países pela primeira vez em mais de 40 anos.
“Protestos e contraprotestos vão ocorrer no Reino Unido e poderão absorver significativos recursos da polícia”, diz ainda o documento.
Michael Gove, ministro responsável pelo planejamento do Brexit, disse que o texto não é uma previsão do que acontecerá, mas fornece “um contexto deliberadamente ampliado para o planejamento governamental, a fim de garantir que estejamos preparados”.
O premiê Boris Johnson prometeu cumprir o resultado do plebiscito de 2016 e disse que tirará o Reino Unido da UE, com ou sem um acordo que garanta uma transição gradual. O país deveria sair da UE no dia 31 de outubro, mas essa data parece agora incerta, após o Parlamento ter aprovado uma lei que obriga o governo a solicitar um adiamento caso não seja fechado um acordo com a UE.
Boa parte do caos previsto provém do enorme congestionamento em portos de ambos os lados do Canal da Mancha, que vai se formar já a partir do primeiro dia, quando o fluxo de caminhões cairá em nada menos que 60%.
O documento diz que a significativa desestabilização dos serviços dos portos de Dover, no Reino Unido, e de Calais, na França, poderá se estender por até seis meses. Os caminhões poderão enfrentar atrasos de até dois dias e meio nas filas para vistorias alfandegárias antes de embarcar para cruzar o canal. Isso poderá afetar a entrada de medicamentos e desencadear compras de combustível movidas pelo pânico. Poderá ainda puxar para cima o preço de alimentos. O Reino Unido importa 75% dos medicamentos que consome.
Além disso, empresas e famílias enfrentarão preços maiores de energia elétrica, diz o relatório.
O governo diz que está tomando medidas para mitigar alguns dos piores efeitos de um repentino rompimento com a UE, maior parceiro comercial do país.
O relatório, da Secretaria de Governo britânica, lembra que o impacto da desestabilização vai prejudicar mais os cidadãos britânicos mais pobres.
O governo vinha se negando a divulgar o estudo sobre os preparativos para o Brexit sem acordo.
Empresas e economistas avisam há muito da ameaça à economia britânica de uma ruptura repentina com a UE. Empresas estocaram produtos para se preparar para a desestabilização do comércio.
O Reino Unido já está há anos preparando-se para uma saída sem acordo. O Banco da Inglaterra, o BC britânico, atenuou recentemente sua estimativa sobre o efeito da retirada sem acordo, ao dizer que a medida encolherá a economia em 5,5%, acrescentando que os preparativos do governo abrandaram alguns dos piores efeitos.
Ontem, a mais alta corte da Escócia deliberou que a suspensão por cinco semanas das atividades do Parlamento britânico é ilegal. A medida foi adotada por Johnson. Mas a corte não ordenou a reabertura imediata do Parlamento. O Tribunal de Sessão, de Edimburgo, optou por esperar uma decisão da Suprema Corte britânica, que vai deliberar sobre essa e outras duas ações semelhantes.

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