Johnson diz que acordo do Brexit é impossível e país volta ao impasse

As perspectivas de um acordo para o Brexit ficaram mais negativas ontem, com autoridades britânicas e europeias trocando acusações sobre quem seria o responsável pelo impasse nas negociações
Com pouco mais de uma semana até a decisiva reunião de cúpula em Bruxelas para renegociar um acordo para o Brexit, autoridades do Reino Unido e da União Europeia (UE) entraram em choque em torno das condições do divórcio e tentaram transferir a responsabilidade por qualquer ruptura nas negociações para a outra parte.
O governo britânico publicou um extenso documento a fim de mostrar seus preparativos para uma saída sem acordo com o bloco. Segundo membros do Gabinete do premiê Boris Johnson, a premiê alemã, Angela Merkel, disse em telefonema ontem que um acordo é “extremamente improvável” de ser obtido na cúpula da UE, marcada para o dia 17.
Após o telefonema entre os dois líderes, uma autoridade britânica disse que Merkel delineou uma posição que “significa que um acordo é essencialmente impossível, não só agora, mas jamais.”
O governo alemão confirmou o telefonema, mas não deu detalhes. Merkel se reuniu ontem com o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk. Antes dessa conversa, Tusk tinha criticado Johnson pelo Twitter com base em informações recebidas de Londres.
“Boris Johnson, o que está em jogo não é vencer uma disputa tola sobre quem é o culpado. O que está em jogo é o futuro da Europa, e do Reino Unido, tanto quanto a segurança e os interesses de nossos povos. O senhor não quer um acordo, o senhor não quer uma prorrogação, o senhor não quer uma revogação, ‘quo vadis’?”, tuitou ele, usando o termo em latim que significa “para onde o senhor vai?”
A deterioração nas negociações levou a libra a cair 0,6%, para seu patamar mais baixo em uma semana, para US$ 1,2209.
A rixa ocorre num momento em que o Brexit volta a caminhar para um impasse. Apesar de Johnson ter repetidamente afirmado que o Reino Unido deixará a UE no dia 31 deste mês, o Parlamento aprovou uma lei que determina que o premiê solicite uma prorrogação de três meses caso não se chegue a um acordo para o Brexit.
Autoridades da UE já esperavam que seriam responsabilizadas pelo governo Johnson pelo fracasso nas negociações, num momento em que o Reino Unido está às vésperas de realizar uma eleição geral, provavelmente ainda neste ano.
Johnson planeja disputar a campanha eleitoral culpando parlamentares britânicos pró-UE pelo fracasso do Reino Unido em deixar o bloco mais de três anos após o plebiscito sobre o Brexit.
Apesar de parecer remota a probabilidade de uma saída sem um acordo no dia 31, o governo Johnson publicou mais detalhes de seu plano de retirada, prevendo desestabilização se o Reino Unido deixar a UE sem um acordo, mas dizendo, ao mesmo tempo, que fez grandes avanços na direção da mitigação dos problemas. O documento corrigia, também, um cronograma de tarifas publicado anteriormente, que entrará em vigor em caso de uma saída sem acordo.
Londres anunciou ainda medidas para otimizar as vistorias aduaneiras nas fronteiras britânicas com a UE a fim de atenuar a interrupção do fluxo, à medida que essas verificações sejam introduzidas pela primeira vez em décadas.
As trocas de acusações ocorreram enquanto as negociações técnicas continuavam em Bruxelas. Autoridades de ambos os lados disseram que um acordo sobre o Brexit tem de ser fechado antes do fim desta semana, para poder ser discutido e aprovado na reunião dos dirigentes da UE marcado para a próxima semana.
Johnson deu indícios de que, segundo suas propostas, a Irlanda do Norte se retiraria, junto com o resto do Reino Unido, da união aduaneira da UE, que impõe um conjunto comum de tarifas cobradas sobre produtos importados vindos de fora do bloco; o acordo costurado por Theresa May mantinha o Reino Unido no âmbito da união alfandegária até a implementação de outros planos comerciais. Pelo plano de Johnson, a Irlanda do Norte permanecerá, ao menos temporariamente, na órbita reguladora da UE no que se refere a bens agrícolas e manufaturados.
Johnson conversou com seu colega irlandês Leo Varadkar horas depois, ontem, em telefonema que durou 40 minutos. O premiê britânico disse que ambos reiteraram seu desejo de alcançar um acordo e que tentariam se reunir ainda nesta semana.
Autoridades britânicas teriam dito ontem, segundo a mídia local, que as negociações provavelmente terminarão nesta semana. Além disso, teriam responsabilizado o governo irlandês por barrar negociações reais em torno de um acordo. Uma alta autoridade do governo que não teve seu nome citado teria dito, segundo a revista “The Spectator”, que o Reino Unido colocaria os países que se opuseram à prorrogação das conversações sobre o Brexit na linha de frente com vistas à cooperação futura, inclusive sobre questões como defesa e segurança, e que puniria as que aprovaram a prorrogação.
Uma autoridade britânica disse ontem que Merkel acha que a UE “tem poder de veto” sobre o abandono da união aduaneira pelo Reino Unido e que a Irlanda do Norte terá de seguir a regulamentação da UE para sempre. A conversa “deixou claro que eles estão dispostos a destruir o Acordo da Sexta-Feira Santa na Irlanda, essencial no processo de paz da Irlanda do Norte nos anos 90.
Com a deterioração nas expectativas de um acordo, o governo da Irlanda anunciou ontem um pacote de € 1,2 bilhão (US$ 1,32 bilhão) de apoio – equivalente a 0,4% de seu PIB – destinado a agricultores e empresas irlandesas para o caso de um Brexit sem acordo.

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2019/10/09/johnson-diz-que-acordo-do-brexit-e-impossivel-e-pais-volta-ao-impasse.ghtml

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