EUA querem barrar China de acordos comerciais

O secretário de Comércio dos EUA, Wilbur Ross, sinalizou que o governo americano deverá pressionar os seus parceiros comerciais para forçar a China a abrir o seu mercado, afirmando que Washington pode replicar uma cláusula anti-China, incluída no acordo recém-concluído com o Canadá e o México.
Em entrevista à agência de notícias Reuters, Ross disse que a medida – que ele chamou de “poison pill” (expressão em inglês para cláusulas de defesa num contrato) – era “outra medida para tentar fechar brechas” em acordos comerciais que têm servido para “legitimar” práticas da China em questões comerciais, de propriedade intelectual a subsídios industriais, como mostrou matéria da Reuters assinada por David Lawder e Karen Freifeld.
Os EUA iniciaram negociações com o Japão e a União Europeia (UE) para reduzir as barreiras tarifárias e regulatórias e tentar reduzir os déficits comerciais dos EUA em automóveis e outros bens.
Se a UE e o Japão assinarem um pacto similar ao do novo Acordo EUA-México-Canadá (USMCA), isso vai sinalizar um total alinhamento com Washington na pressão para obrigar a China – a segunda maior economia do mundo – a promover profundas mudanças na sua política econômica.
A cláusula no USMCA (que deverá substituir o Acordo de Livre Comércio da América do Norte, o Nafta), efetivamente dá a Washington poder de veto sobre eventuais novos acordos comerciais do Canadá e do México, para garantir que sejam economias que sigam os princípios de mercado e com pouca interferência do Estado – questões que estão no centro da guerra comercial do presidente Donald Trump contra a China.
De acordo com a cláusula, se algum dos três países do USMCA fizer um acordo comercial com um país que não seja uma economia de mercado, os outros dois estarão livres para sair em seis meses e formar seu próprio acordo bilateral.
“É racional, trata-se de uma espécie de ‘poison pill'”, disse Ross.
Questionado se essa cláusula seria repetida em futuros acordos comerciais, Ross respondeu: “Veremos. Certamente ajuda o fato de termos conseguido isso com o México e o Canadá, independentemente de conseguirmos isso com qualquer outro país”.
Mas ele acrescentou que, com o precedente agora estabelecido, será mais fácil adicionar essa cláusula em outros acordos comerciais. “As pessoas podem entender que este será um dos pré-requisitos para fazer um acordo [com os EUA].”
Arthur Dong, professor da McDonough School of Business, da Universidade Georgetown, disse ao “Financial Times” que esse esforço dos EUA para limitar a relação comercial de outros países com a China marca um “afastamento bastante significativo da postura comercial anterior dos EUA” e “nada menos do que uma intencional mudança estratégica da ordem global de comércio”.
Para Dan Price, ex-alto funcionário do governo George W. Bush, a cláusula anti-China “basicamente extende a arquitetura de sanções secundárias dos EUA aos acordos comerciais. “Se você deseja ter acesso preferencial ao mercado dos EUA, não pode concluir acordos de livre comércio com países que não gostamos”, afirmou Price ao “FT”.
A China reagiu com irritação à provisão incluída no USMCA. Em uma declaração para repórteres canadenses, a Embaixada
da China em Ottawa disse que a cláusula reflete um “comportamento desonesto” que viola a soberania das nações e reflete falsas definições de economias de mercado.
As negociações com a UE e com o Japão têm como pano de fundo a ameaça de Trump de impor uma tarifa de 25% sobre carros e autopeças importados. O Departamento de Comércio conduz um estudo sobre se tais importações representam uma ameaça à segurança nacional. O USMCA isenta o Canadá e o México dessas tarifas.

Os EUA citaram preocupações com a segurança nacional quando anunciaram sobretaxas à importação de aço e alumínio de vários países no início de março.
Ross disse que o Canadá e o México efetivamente “não estão mais em posição de se opor [às tarifas de segurança nacional], porque assinaram um acordo que diz que, se adotarmos essas tarifas, isentaremos os primeiros 2,6 milhões” de veículos importados de cada país.
Ross não quis comentar o momento de divulgação dos achados do estudo com base na “seção 232”, observando que Trump disse que não vai impor tarifas sobre carros enquanto estiver negociando com a UE e o Japão.
Mas em um sinal de que essa avaliação pode demorar mais tempo, Ross disse que o Departamento de Comércio está incorporando detalhes das novas provisões do setor automotivo no USMCA, que efetivamente vão exigir que um percentual maior dos automóveis seja produzido nos EUA.
Ross também disse que o Japão deveria tomar medidas para “mudar a produção para os EUA” para reduzir seu superávit comercial automotivo de US$ 40 bilhões. Ele não quis dizer se o governo Trump vai exigir uma limitação voluntária nos volumes de exportação de automóveis do Japão.
“A metodologia que usaremos será determinada pelas negociações. Há muitas maneiras de resolver as coisas”, disse Ross. “Queremos mais produção de tudo nos EUA. Esse é o tema de nossa música com todo mundo.”
Ross disse que não espera muita movimentação nas negociações comerciais da China antes das eleições para o Congresso dos EUA, em 6 de novembro, acrescentando que as autoridades chinesas não parecem dispostas a conversar no momento.
O secretário de Comércio disse que a avaliação de algumas autoridades chinesas de que Trump será enfraquecido por um avanço dos democratas no Congresso é um erro de cálculo, porque “os verdadeiros fazendeiros, os fazendeiros reais resistem” e não vão abandonar Trump e os republicanos no Congresso.

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