Soft power e o Marketing Esportivo

Clarisse Setyon

Comecei lecionando na graduação em um curso de Relações Internacionais.

De início não me importei muito com o significado do termo. Achei que tivesse algo a ver com o Itamaraty. Fui escolhida para lecionar, pois tinha experiência em Comunicação e Marketing e era habilitada para ministrar as aulas em inglês. Que legal, pensei … um curso que tem aulas em inglês. Quisera eu poder ter desfrutado desta vantagem competitiva quando no estudo superior. Enfim, são outros tempos.

Aos poucos, em um fácil processo de integração com os demais professores do curso, fui, devagar, entendendo um pouco sobre Relações Internacionais. Na nossa escola, este curso tem muito pouco a ver com o Itamaraty. Tem muito mais a ver com a união da geopolítica (adoro esta palavra) e as relações internacionais na gestão de negócios no mundo globalizado e complexo do século 21..

Vi aí uma oportunidade de aprendizado. Fui buscar um livro chamado Primeiros Passos, sobre Relações Internacionais. Confesso que mais me confundiu do que “me esclareci”. Continuei indo em busca de conhecimento. Fui percebendo que uma parte do que se escreve e se discute nesta área tem muito a ver com o ambiente profissional que tive o privilégio de frequentar, nos anos 90, na Europa, trabalhando para uma empresa transnacional (antes, na minha ignorância, eu chamava estas empresas de multinacionais !!).

Cavocando mais fundo me deparei com um termo simpático: soft power.

Gosto do som da palavra. Gosto do que ela parece significar. Um professor, de incrível competência, talvez notando minha ignorância no assunto, tentou me convencer que soft power pode ser traduzido por poder de atração, poder de sedução. Ah … não me deixei enganar … sedução é outra coisa … quer dizer, acho que é outra coisa.

Soft power, ou poder brando, é um termo usado na teoria de relações internacionais para descrever a habilidade de um corpo político, como um Estado, para influenciar, cooptar, atrair ou ainda persuadir indiretamente o comportamento ou interesses de outros corpos políticos por meios culturais, militares ou ideológicos. Talvez quem definiu o termo (um professor de Harvard, chamado Joseph Nye) não tenha pensado no meio esportivo…

De vez em quando, nos acontecimentos da vida, fui tentando encaixar esta sonora palavra aqui e ali.

Uma noite destas, já tendo encerrado o expediente mental e tentando pegar no sono, BINGO, achei um encaixe perfeito para o tal do soft power …

Foi outro dia a Nissan resolveu encerrar um contrato de patrocínio de R$ 21 milhões que tinha com o Vasco da Gama, alegando não estar de acordo com o comportamento da torcida, devido aos seus “atos de inaceitável violência” (Folha de S.Paulo), durante uma partida contra o Atlético Paranaense.

Fecha a cena.

Outra cena: O governo do Rio de Janeiro, há tempos, declarou que deseja ser presidente do Vasco da Gama (é só procurar na internet e você encontrará várias fontes a respeito), o que nos leva a crer que ele deve ser vascaíno “roxo”. Há outros indícios a respeito: foi publicado no site Terra, em agosto de 2013, que Sérgio Cabral e o Ministério da Fazenda (sim, da Fazenda, não me enganei) articulam acordo, sem precedentes, a fim de amortizar a dívida do clube.

Fecha a cena.

Nova cena: A Nissan está investindo mais de R$ 2 bilhões na construção de uma fábrica em Resende, no Estado do Rio de Janeiro.

Fecha a cena. Ligue os pontos.

Teria o governador carioca usado sua habilidade de soft power para convencer a Nissan a patrocinar o Vasco da Gama ? Teria a Nissan usado sua habilidade de soft power para obter isenções de todos os tamanhos, tipos e espécies para a construção de sua fábrica no Rio de Janeiro ? Ou será que poderíamos pensar em algo mais para hard do que para soft power ?

Não sei quem ganha e quem perde nesta batalha de relações, mas meu conhecimento de Marketing Esportivo me diz que o cancelamento do contrato da Nissan com o Vasco pouco teve a ver com o comportamento violento da torcida. Estaria talvez mais relacionado com o rebaixamento do time.

A Nissan pode ter sido seduzida uma vez (professor, você tem razão, soft power pode ser traduzido como sedução, sim !!), mas como me parece uma empresa consciente de sua imagem de marca, quiçá ela não queira que sua marca esteja vinculada a um time de segunda divisão … afinal, estamos falando de uma marca patrocinadora da Rio 2016, cujo público alvo, possivelmente, seja outro. É bem provável que a Nissan saiba a importância da “aderência” da sua marca àquilo que deseja patrocinar.

Minha conclusão: Marketing Esportivo é mais bem feito sem soft (ou hard) power, com todo o respeito às Relações Internacionais. Cada um no seu quadrado, certo Sr. Sérgio Cabral ?

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