São Paulo: Janela cultural para o mundo

Por César Veronese, professor do CPV VESTIBULARES

Há poucas semanas, na edição no. 734, de 06.02.13, a revista Carta Capital publicou uma matéria especial intitulada O VAZIO DA CULTURA (OU A IMBECILIZAÇÃO DO BRASIL). Os diversos artigos que a compõem problematizam vários aspectos da realidade cultural brasileira, a qual às vezes espelha, outras contradiz aspectos da vida econômica, social e política do país.
A reportagem especial apresenta colocações pertinentes e, ao mesmo tempo, abre-se para uma discussão em torno da crise da chamada cultura letrada produzida, principalmente, pela classe média e a elite brasileiras. Na verdade, acreditamos não haver, a rigor, uma crise de produção de obras e bens culturais de qualidade, mas, antes, uma falta de espaço, na grande mídia, para dar visibilidade a uma produção criativa existente hoje no Brasil.
Admitindo-se que as duas crises de fato existam, da produção de obras e de espaço capaz de colocá-las em evidência, não podemos admitir esta tese pelo menos para a cidade de São Paulo. A cidade à qual Macunaíma atribuiu a alcunha de Macota e hoje vive sob os signos do desconforto, do excesso e da violência, é, no entanto, um centro irradiador de bens culturais de qualidade e de referência internacional.
Por esse motivo, quero destacar nesta nossa primeira conversa aqui neste blogue um primeiro (falaremos em outras ocasiões de outros) e interessante espaço cultural oferecido pela metrópole, bem como sua programação de reconhecimento internacional.
Trata-se do Centro Cultural Banco do Brasil. Localizado no no. 112 da rua Álvares Penteado, entre as estações Sé e São Bento do metrô, no coração do centro antigo da cidade, o espaço ocupa um charmosíssimo prédio art nouveau dos anos 20. Pisos com mosaicos de pastilhas, teto com vitrais cor de âmbar e elementos decorativos da mitologia grega, são apenas alguns dos aspectos arquitetônicos responsáveis pela elegância do imóvel.
Sua programação eclética é composta por música, teatro, cinema, artes visuais, atividades lúdicas, contação de histórias, cursos e palestras. As artes plásticas têm tido enorme visibilidade, como aconteceu ano passado com a exposição do Impressionismo Francês, cedida pelo Museu d’Orsay, que atraiu mais de 200 mil visitantes.
Mas o cinema talvez seja o verdadeiro carro-chefe do CCBB. A programação alterna mostras sobre diretores mais conhecidos, como Hitchcock, Bergman e Bertolucci, e diretores cult, às vezes pouco conhecidos entre nós. Nesta última categoria, sobretudo, se inscrevem exibições de cinematografias completas, acompanhadas de palestras, cursos, debates, edição de catálagos (alguns dos quais com o valor de livros) e, não raro, a presença dos próprios diretores.
Desse modo, nos últimos anos, o CCBB realizou retrospectivas completas, entre tantos outros, de Agnès Varda, Chantal Akerman, Tsai Ming-Liang, Monika Treut, Luc Moullet, Alain Resnais, Robert Altman, Léa Pool. Agora, em fevereiro, acabou de acontecer uma mostra com mais de 40 filmes de um dos gênios do cinema experimental, o lituano Jonas Mekas.
Além de diretores consagrados, o espaço tem destacado também filmes de cinematografias com pouco espaço no cinema comercial, como a produção indiana, turca, escandinava, georgiana e até vietnamita. Some-se a isso as excepcionais curadorias orientadas por professores da USP, da UFRJ e uma série de jovens críticos oriundos da Sorbonne.
E o público? Constituído sobretudo por cinéfilos de meia idade e idosos, além de alguns jovens, às vezes estudantes de cinema, é um público que abre os olhos para a tela como o crente abre seu breviário. O espaço proíbe o consumo de qualqeur tipo de alimento dentro da sala. Se algum desavisado, no entanto, ousar farfalhar um papel de bala, será no mesmo instante reprimido em coro pelos espectadores.
Neura? Esnobismo? Gratuidade? Implicância? Nada disso. Apenas atenção de um público honesto para quem o silêncio, em qualquer obra de arte, não é silêncio, é eloquência. E para quem o tempo dispensado para a apreciação de um filme não é nunca um tempo de entretenimento, mas um tempo da percepção, da reflexão, da reelaboração do olhar sobre o semelhante e o mundo que nos cerca.
Competência dos curadores, excelência de programação, maturidade do público e educação dos funcionários, são fatores que permitem aos espaços de cinema do Centro Cultural Banco do Brasil de São Paulo, Rio e Brasília ombrear com o melhor dos cineclubes de Nova Iorque, Londres, Paris e Berlim, e cumprir a função principal a que se destina o cinema de arte: criar um público inteligente e crítico capaz de refletir e problematizar sobre a condição humana e a dialética do homem com o mundo.
Esse espaço magnífico apenas não recebe destaque maior nas avaliações frequentemente aparecidas em jornais e outros órgãos de imprensa, porque os “críticos” que avaliam as salas de cinema em São Paulo estão sempre mais interessados no espaço entre as poltronas e nas guloseimas da bombonière do que na programação!
Se você não frequenta o CCBB, seja bem-vindo a esse (com perdão pelo clichê) oásis de sofisticação e excelência na cidade de São Paulo.
Em tempo: até o dia 17 de março, o CCBB dá continuidade à mostra MONDO TARANTINO, em homenagem aos 50 anos do cineasta Quentin Tarantino. Todos os filmes têm entrada franca.

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