O que há de comum entre o Brasil e um besouro?

Cesar Veronese, Professor do CPV Vestibulares

Está chegando a hora. Malgrado os protestos, a Copa irá acontecer. Afinal de contas, quem dá as cartas do que se faz ou não se faz no planeta são instituições e empresas para as quais nenhum cidadão comum teve o direito de eleger os seus presidentes e conselheiros: FIFA, FMI, Banco Mundial, Monsanto…

O Brasil agitou-se e continua a se sacudir com os protestos nas ruas. Vieram tarde, deveriam ter começado em 2007, quando o país foi escolhido para sediar a Copa. O certo é que o massacre midiático já tomou conta de tudo e ninguém deve se espantar se os manifestantes resolverem, nos próximos dias, marcar os protestos pela manhã para à tarde poderem acompanhar os jogos. Nem será surrealista flagrar um sem-teto numa barraca em frente à Prefeitura acompanhando a seleção brasileira na tela de um celular.

Assim será em todo o planeta. Podemos imaginar um marroquino em seu casebre vidrado num televisor de sucata, um pastor nas montanhas do Chipre vibrando com o cajado na mão, ou ainda um camponês de Honduras expulso de suas terras por uma empresa americana que planta eucaliptos (compensação dos hidrocarbonetos), mas eufórico com o gol de uma seleção europeia.

O engodo alardeado pela mídia será o de sempre: a união dos povos, a grande humanidade, a alegria e a fraternidade universais que só o futebol possibilita… Na prática, não é necessário ser sociólogo para constatar a falsidade desse discurso. Quando vemos diariamente jogadores trocarem de times e justificando que no novo time poderão desenvolver o seu “potencial” (antes eles ganhavam um milhão de dólares por mês, agora ganharão 1,5 milhão), não dá para acreditar em fraternidade alguma. Que trabalhador HONESTO ganha 1 milhão de dólares por mês?

Percebemos, assim, que a democracia promovida pelo futebol é em primeiríssimo plano a do consumo, bastando lembrar das camisas oficiais adquiridas (por ricos e pobres) na faixa de 400 reais. Mas isso tudo é disfarçado pelos departamentos de marketing das empresas patrocinadoras dos times com suas ONG’s, trabalhos de inclusão social e outras maquiagens. No que diz respeito às seleções nacionais, a maquiagem envolve política, como a história dos mundiais revela tão bem. Mas isso é outra história…

Na última Copa do Mundo, uma loja de uniformes para domésticas, na rua das Fiandeiras, em São Paulo, ostentava em sua vitrine aventais de cozinheira com o desenho da bandeira do Brasil. Na alegria da Copa, patroa e empregada se irmanavam. Ou, por outra: enquanto uma lava a louça, a outra lava as mãos. E assim todos permanecem, há 500 anos, em seus devidos lugares.

É bem provável, portanto, que após os primeiros minutos do primeiro jogo do Brasil, a chama dos protestos se apague, confirmando nossa condição de país besouro. Besouro é aquele bicho que tomba com as patas para o ar e fica esperneando num desespero dos diabos. Até que uma boa alma o coloca outra vez com as patas sobre o chão. Para segundos depois ele capotar e ficar implorando para ser “desvirado”.

Para ler outros textos do Professor Veronese, acesse blog CPV (link dicas culturais do Verô).

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