A Incompetência como um Risco Político

Rodolpho Bernabel

O mercado financeiro costuma se animar e se decepcionar mais rapidamente do que o restante da sociedade com novos governos. As derrotas do PT na justiça criminal e nas urnas, o início do governo do Presidente Jair Bolsonaro e de um parlamento bastante renovado, a perspectiva de uma onda liberal e uma sociedade civil mais ativa e fiscalizadora de seus líderes políticos ajudou a impulsionar nossa bolsa de valores, que chegou a operar acima da marca histórica dos 100 mil pontos. Mas não contavam com tanta “astúcia”! A bolsa já recuou bastante desde então.
Não vou nem entrar na questão do incrível exército de Brancaleone que se instalou no ministério das relações exteriores, no ministério da educação e no ministério da mulher, da família e dos direitos humanos. No caso dessas burocracias a lista de trapalhadas é muito longa dada sua tão breve duração. Quero me ater à questão da reforma da previdência e seu exército de um homem só.
Paulo Guedes parece tentar fazer o que pode para aprovar a tão necessária atualização da previdência. Na mais recente tentativa de diálogo público com o congresso caiu numa armadilha provocatória e acabou perdendo a linha; todos pagaremos por isso. Pelo menos, o ministro da economia atua na direção correta da implementação da policy.
O maior problema, no entanto, é bipartite: de um lado, há pouca discussão sobre projetos com os parlamentares, embora encontros entre Executivo e Legislativo venham ocorrendo, como mostra um levantamento feito por Bruno Carazza no Valor do dia 1/4/2019; (https://www.valor.com.br/politica/6191107/muita-conversa-e-pouco-conteudo) por outro lado, Bolsonaro não tem conseguido mobilizar sua base de apoio entre os eleitores para que esses pressionem o Congresso a dar rápido andamento à reforma e, o que é pior, seus assessores informais vêm repetidamente metendo os pés pelas mãos e atrapalhando a condução de todo o processo.
Se nos concentramos na questão institucional da relação Executivo-Legislativo, podemos pensar que a visão de Bolsonaro é um tanto purista, alegando que fez sua parte encaminhando a proposta de reforma ao Congresso e agora lava suas mãos. Dando ao presidente esse benefício da dúvida, acreditando ser Bolsonaro um leitor de Monstesquieu, precisamos avisá-lo que o novo equilíbrio político que ele almeja necessita da pressão popular sobre o Parlamento, e que isso é bastante difícil de mobilizar e sustentar por muito tempo, sobretudo quando suas inserções nas mídias sociais, seu mecanismo de comunicação com as bases, têm sido, via de regra, desastrosas.
Talvez Bolsonaro esteja a governar de acordo com sua ética da convicção, como dizia Max Weber, temendo que agir de acordo com a ética da responsabilidade o leve a jogar xadrez com Lula e Temer na prisão, como ele mesmo afirmou. Todavia, é possível manter a ética da convicção articulando um trade-off no Congresso, trocando a aprovação da reforma pela aprovação de projetos de leis caros aos deputados, mas de menor importância para o Executivo, processo esse conhecido como logrolling na ciência política. Essa articulação não só é legal como preserva a ética da convicção e, mais ainda, parece ter sido a única estratégia que restou ao governo.
Em outubro de 2003, ouvi do Professor Luiz Werneck Vianna a citação que reproduzo adiante, à época o professor advertia o governo Lula ainda em seu início: “O tempo em política é como o dinheiro em economia, não admite gastos perdulários”; o tempo do governo Bolsonaro está passando mais rápido.

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