A ética, as palavras e os interesses políticos

Cesar Veronese , Professor do CPV Vestibulares

Na última quinta-feira, 15.03.14, o Brasil assistiu ao encerramento de um marco histórico na política brasileira: o julgamento dos envolvidos no mensalão, a prática de compra de apoio político no Congresso pelo governo do PT. O Supremo Tribunal Superior dedicou 69 sessões ao longo de quase 7 anos ao mensalão. No cômputo final, foram condenadas 24 pessoas, entre políticos, banqueiros, empresários e outros “menores” que pagaram caro pelo patrão, como Simone Vasconcelos, a ex-funcionária de Marcos Valério, um dos “cabeças do esquema”.

Todas as penas foram revistas após a análise dos recursos apresentados pelos respectivos defensores de cada condenado, e o tempo de permanência na prisão foi drasticamente reduzido. Os envolvidos reivindicam agora o julgamento por parte de uma corte internacional, alegando que foram vítimas de um julgamento fundado sobretudo em critérios de natureza política. São, claro, todos inocentes, vítimas de complôs de gente do mal!

Uma das decepções na reta final do julgamento foram as atitudes do ministro Luis Roberto Barroso, que passou a integrar a corte de ministros do STF no final dos julgamentos, e é acusado de ter feito articulações para suavizar as penas de oito envolvidos no caso, entre os quais José Dirceu, José Genoíno e Delúbio Soares.

As declarações de Barroso são exemplos da velha política brasileira, cujas decisões são tomadas na moita e expressas numa língua melíflua, aparetentemente conciliadora, mas na essência muito vaga e a serviço dos poderosos (e, no caso, dos protagonistas dos crimes). Vejamos algumas pérolas do dicionário Barroso a respeito dos julgamentos: o mensalão foi um “rito de passagem” do qual ele espera que surjam “transformações”; na política é preciso “diminuir o papel do dinheiro” e “atrair novas vocações”, assim como é necessário “criar um sentimento mais amplo de respeito ao outro”.

Barroso empregou essas afirmações para explicar o maior julgamento de condenação de políticos corruptos da história do Brasil. Mas um bom professor de redação, supondo que elas aparecessem num texto escolar de um aluno do ensino fundamental, poderia circulá-las com uma esferográfica vermelha, apontá-las como “discurso vazio” e atribuir uma nota bem baixa ao texto.

De qualquer modo, o julgamento foi histórico e a sociedade brasileira parece não continuar mais apenas curtindo o seu berço esplêndido. É preciso fazer barulho, sair às ruas e reivindicar. Inclusive neste momento em que a cidade de São Paulo (como acontece todos os anos) está com os seus reservatórios de água com menos de 20% de suas respectivas capacidades. A Sabesp, órgão do governo do Estado, alega que para suprir as necessidades dos paulistanos são necessários mais dois reservatórios, o que custaria 10 bilhões aos cofres públicos.

Por outro lado, o paulistano sofre diariamente com o pior sistema de transporte público do país. Os números de linhas de metrô são pífios em relação à demanda da população. O sistema de ônibus, que compete à Prefeitura, também não dá conta da demanda da cidade. Governo do Estado e Prefeitura se lamuriam sobre os altos custos para suprir essas necessidades. São respostas que não convencem, pois todos sabem que a arrecadação de impostos do Estado de São Paulo é a maior do país. Quanto à Prefeitura, podemos indagar: para onde vão os 6 bilhões de reais arrecadados anualmente com a farsa da inspeção veicular?

Para ler outros textos do Professor Veronese, acesse blog CPV (link Dicas Culturais do Verô).

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